Nas traseiras e na cozinha

Sinto tudo muito. Demasiado. À beira do colapso e da mente rasgada. Sinto no precipício; em queda livre ou voo em pique. Sinto sempre, quase sempre, mas principalmente quando os dias se tornam mais curtos. Talvez seja a escuridão, mas não lhe é exclusivo. Porque também sinto no calor do verão e na palidez de paredes quentes. 
    Dificilmente sinto em doses mornas. Vem tudo tão intensamente, como que a suplicar uma osmose que dure para sempre. Ainda assim me desprendendo, me tomo, me torno dono de mim. E olho o céu escuro para que me adapte às constelações que sempre ali estiveram, mas deixara de ver. 
    O vento que vem do oeste bate portas e empurra as nuvens pela noite vasta. Afoga-as atrás das estrelas e tenta cobrir o Vénus mais brilhante. Mas Vénus brilha, e vê-me dormir, e lança-me uma brisa forte nos cabelos curtos.

E eis que encontro um bilhete, de agosto antigo, que nem sei como tenho ainda, ou porquê. Que me transporta para o exato momento em que o escrevi, na cozinha e nas traseiras de uma casa grande, mas calada; e leio:

dia 12. A lua desapareceu e deu espaço às estrelas. 
acabei de ver a estrela cadente mais forte dos meus 25 anos. 
É fácil esquecer-me do céu e do som das árvores. nem sempre consigo ver. iluminam as ruas as lâmpadas laranja que pintam o céu. Mas hoje consegui. depois deitei-me nos paralelos a ver se apareciam mais, mas não vieram. uma bastou-me.
é bom saber que continua tudo aqui. a guiar-me

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