A Primavera é um estado e para mim chegou hoje. O sábado está para o caseiro e só mais logo terei que ir à rua. De manhã fui fazer uma corrida antes do pequeno almoço e depois tomei um duche e estendi a roupa.
Passei o resto do dia a ler. Ora A Balada Para Sophie, ora um guião que se rodará no verão. A meio ainda almocei. Fiz pescada com cogumelos, beringela e pimentos e temperei com polpa de tomate e molho picante. E alho, muito alho. Depois piquei uns tremoços para sobremesa.
A minha colega do quarto ao lado levantou-se cedo. Sei-o porque a ouvi. Quando me levantei ela já tinha saído, mas reparei que tinha limpado a casa toda; de esfregona e tudo. Tinha uma mensagem dela no telemóvel, toda contente: era um vídeo a agradecer-me por uns bilhetes que lhe arranjei para a última temporada de um espetáculo ao vivo.
Pelo meu colega de casa não dei presença, mas também não senti falta. Creio que tenha dormido no apartamento, mas talvez tenha saído quando me ausentei de manhã.
O sol agora fica até mais tarde na janela da cozinha onde me ponho. Durante as leituras da tarde fui alternando o peso do livro do capa dura com as páginas leves do guião roxo. Preferia-o verde, mas a papelaria não tinha outras cores.
Pelo que hoje estou sozinho e acompanha-me um silêncio confortável. Está bastante calor e volto a lembrar-me da casa dos meus pais. Em alguns fins de semana quentes, costumava pausar o que estava a fazer e ia sentar-me nas escadas de granito lá fora. Ia desnudado, para morenar a pele, e levava comigo um chapéu de palha e um livro.
Quando me fartava de ler, deitava-me na pedra e ficava a ouvir o cântico dos pássaros ou os vizinhos ao longe. De vez em quando levantava-me para ir buscar uma bebida fresca e assim ficava até o sol desaparecer tarde atrás do bosque.
Aqui o sol esconde-se cedo atrás dos prédios degradados. Não ouço o cântico dos pássaros, mas o motor dos frigoríficos a trabalhar. Vou ouvindo dois vizinhos brasileiros, mesmo aqui ao pé, falar de uma janela para a outra, mas não me importo. Até gosto. Ao jantar eles costumam fazer grelhados e o apetitoso cheiro a comida exótica inunda o prédio.
Tento arranjar o meu espacinho para escrever à frente da pequena janela. Condiciono-me entre a roupa suja amontoada no chão à minha esquerda e o eletrodoméstico posicionado à direita. Mas estou bem, acho. As bochechas queimadas e a testa suada.
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