O Reencontro
Era de manhã quando dei por mim a caminhar pela íngreme
subida que entrava no bosque. Escorreguei na terra seca – como era habitual – e fui imediatamente cumprimentado
por uma bela brisa acompanhada por uma simples dança das plantas em meu redor. Como amo esta melodia que o vento me
canta.
Não vim aqui por opção. Não! A escolha não foi minha...
Senti-me chamado mal acordei. Senti tamanha obrigação de ir ao espaço onde
agora me encontrava que me obriguei a sair de casa sonolento, arrastando os meus pés em passos lentos. Algo me chamou: Ela chamou-me.
Comecei por cumprimenta-la - é algo que já se encontra tão
intrínseco em mim que poderia chamá-lo de ritual. Deixei-me apenas de calções
para poder sentir-me mais próximo Dela e comecei por olhar. Um infinito da
cidade e das montanhas acompanhava a minha linha do horizonte. Isto não tem fim. Isto nunca acaba.
De seguida levei as mãos aos Céus e foi na suave brisa que
toquei. Balancei os braços de um lado para o outro e os
meus dedos e mãos tornaram-se pesados. Toda aquela energia tornava as minhas
mãos quase dormentes.
Estava tudo belo, mas estranhamente monótono. Não foi, de certo, para isto
que fora chamado... Sentia algo de muito banal nisto tudo. Porque será que aqui estou?
Então limitei-me a andar. Senti as folhas secas de Verão tornar os meus pés nus desconfortavelmente quentes e aproximei-me mais do
abismo, avistando a pedreira abandonada bem lá em baixo. Afastei-me e caminhei
por cima das rochas cinzentas, procurando encontrar algo que me despertasse interesse.
As moscas irritantes insistiam em pousar nos meus pés e eu enxotava-as
em vão. Desisti e sentei-me no chão, observando como um miúdo o mundo que tinha
pela frente. É infinito – lembro-me
de pensar.
E foi aí que tudo começou; quando os meus olhos fecharam. Foi aí O Reencontro.
Lembro-me de estar sentado e deixar-me tombar para a frente – para o abismo. Mas não caí... Flutuei colina a baixo!
Mas o voo não foi longo... Terei ganho ferrugem? O meu corpo estava habitado por
medo e incerteza. Os meus olhos fechados impediam o meu corpo de ver o que o rodeava e as incertezas obrigaram-me a voltar para a minha pele e lutar contra o
desconhecido. Não queria abrir os olhos... Mas a vontade de ser carne era
grande demais.
Os medos trouxeram-me um urso que rondava as minhas costas.
A imaginação é uma arma poderosa, mas eu lutei. Elas estão sempre contigo - lembro-me de me terem dito - Nada temas!
E eu nada temi! Elas
chamaram-me aqui. E esta vinda ensinar-me-ia algo.
Abri os olhos e levantei-me, caminhando mais uma vez em direção às
rochas.
E então senti algo... Uma presença! Rodei os olhos na sua
direção e vi-a! Seria uma borboleta? Uma libelinha? Um gafanhoto?
As asas em forma de parapente eram decoradas por um padrão
de zebra. Um tom branco pintado com umas finas riscas pretas tornavam este pequeno
ser bastante peculiar e atrativo. As suas asas terminavam numa pequena cauda de duas pontas - uma
mais comprida que a outra – que, por sua vez, eram decoradas por duas pintas amarelas.
Mas logo percebi que ele não estava sozinho. Um outro – de cor
mais amarelada – passou a voar perto de mim na direção do seu acompanhante e
foram os dois até ao Céu, fazendo piruetas com as asas muito juntas, namorando.
E foi então que um outro apareceu! E outro, e outro! E aos poucos
multiplicavam-se! Rodopiavam à minha volta enquanto o vento se tornava cada vez
mais intenso, dando àquela leve brisa um poder tão forte ao ponto de roubar as folhas às mais altas árvores!
A sensação era de outro mundo. Mais de dez voadores dançavam a menos de um metro de mim e era possível sentir a sua proximidade mesmo de olhos
fechados. Nós eramos um só. Tudo era um só.
Quando o vento cessou pressenti quer era altura de partir... Que já tudo estava experienciado e que o propósito da visita tinha sido concluído. Mas
não me dei por satisfeito! Queria ter os voadores pousados nas minhas mãos. Queria
senti-los! Ter um contacto direto com eles. Mas por muito que
insistisse, eles não vinham... Resignavam-se a aumentar esta proximidade física.
Debati-me com este dilema. Porque não me tocavam? Porque não pousavam em mim? Porquê!? A resposta chegou tão rápido como a pergunta: eu não estava humano! Eu
não precisava de sentir o toque deles. Porque eu já os estava a tocar. Eu já os
tinha tocado – um número incontável de vezes. Nós tínhamos voado juntos até aos
Céus!
O vento soprou ainda mais alto e trespassou-me o peito,
furando-me pelas costas e enchendo-me de Luz.
Quando tudo terminou, agradeci-lhes e despedi-me, sentindo-me desiludido por sentir que não fora uma despedida recíproca... Mas logo o pensamento se desvaneceu quando observei o pequeno ser amarelo acompanhar-me até à saída do bosque, para voar, de seguida, em direção à cidade.
Quando tudo terminou, agradeci-lhes e despedi-me, sentindo-me desiludido por sentir que não fora uma despedida recíproca... Mas logo o pensamento se desvaneceu quando observei o pequeno ser amarelo acompanhar-me até à saída do bosque, para voar, de seguida, em direção à cidade.
As árvores da rua sopravam forte enquanto eu caminhava no
passeio. E foi então que eu percebi tudo. Percebi a razão desta visita, deste
chamamento:
Elas não se despediram de mim porque Elas estão sempre
comigo. Em todo o lado. Mesmo nas árvores poluídas da cidade, mesmo nas nuvens mais cinzentas que parecem descontentar todos. Elas estão lá.
Isto não foi O Reencontro, isto foi
Um Encontro. Porque Elas nunca me deixaram, nunca me abandonaram. Sempre me olham
e observam. Porque Elas estão aqui, comigo, dentro de mim. Porque Elas sabem e
eu sei:
Este é quem eu sou. E é aqui que eu pertenço
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