CAPÍTULO I Conheci o Zé Carvalheiro numa ação de distribuição de bebidas gaseificadas. Fomos contratados para carregar mochilas térmicas de 15kg pelo verão infernal de Lisboa e só nos safou as que fomos bebendo à pala durante oito horas. Mais tarde reencontramo-nos numa ação de distribuição de mentos, mas nem as caixinhas que sobraram compensaram o preço que recebíamos à hora. Mas já não sei porque raio terá sido, ficamos amigos. O Zé estudou Belas Artes e agora é ilustrador no Público, mas na altura andávamos a fazer estes trabalhinhos de caca. Por vezes montava barracas na Feira da Ladra para exibir os seus trabalhos e cheguei a comprar-lhe um autocolante com uma ovelha que dizia "Life is a - meeeeh – zing", que guardei religiosamente na carteira. Uns meses depois descobrimos que éramos vizinhos. E em alturas em que eu não estava para aturar os 4 marmanjos com quem vivia, íamos à Paiva Couceiro ver os velhotes discutir e os putos ...
O meu irmão trabalha no McDonald’s e com o tempo foi acumulando cupões de refeição. No Natal, para gozar comigo, ofereceu-me 5 vales para gastar até ao final do ano e então fui lá hoje. Não como isto desde 2019, mais por recorde do que por outra coisa, mas estamos a falar de 5 refeições à pala - outro recorde que não me importo de adicionar ao meu arsenal. A minha mãe sugeriu irmos a outra franquia que não a dele para “não envergonhar o miúdo” e eu concordei. Quando venho a casa, uso quase sempre os fatos de treino do meu irmão porque deixo a minha roupa em Lisboa, por isso entrei, que nem um mãos largas, de calças de pijama no restaurante. Atravesso em câmara lenta o amontoado de pessoas que vão reclamando com o touchscreen das máquinas de self-service e vou diretamente à caixa, completamente vazia. Atiro os cinco cupões, que nem um dealer de casino, para o balcão, e o gajo fica a olhar para mim enquanto me esbanjo...
Segunda feira, 28 de abril de 2025. Apagão total em vários países da Europa. i. Só me apercebi porque o trânsito ficou, de repente, caótico. Nos cruzamentos ninguém respeitava ninguém, e decidiam por eles próprios que direções tomar. Os carros estavam todos atabalhuados em para-arrancas e hesitações, e só aí me apercebi que os semáforos não funcionavam. Depois os passeios começaram a encher. As pessoas saíam das casas e vinham para a rua ver o que se passava. Estavam todas ao telemóvel, ora em chamadas telefónicas, ora a prepararem-se para. Caminhei imune a tudo, interpretando como exceção, até que me apercebi que não o era. As pessoas caminhavam mais apressadas, com urgência, e comecei a ouvir as primeiras sirenes ao longe. Foi aí que tirei os fones para ouvir, como se um sentido extra fosse resolver uma situação global. Peguei no telemóvel e liguei os dados móveis, que estavam mais lentos e demoraram mais a carregar. ...
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