A barber named Mohammed
Aparentemente não é a escolha mais recomendada para quem vive da imagem, mas quando não corto o cabelo em sets de filmagem, faço-o nuns paquistaneses na Almirante Reis; e hoje foi domingo de tosquia.
Vou lá porque gosto. São profissionais, trabalham na área há anos e não cobram um apêndice de cada vez que te vão ao pêlo. Por 4.50€ não te massajam o cabelo nem passam os melhores produtos do mundo, mas trabalham rápido, bem e sem marcação.
Hoje fui atendido por um gajo novo, o Mohammed, que foi um porreiraço e me deixou com vontade de voltar no próximo mês. Até me encorajou a cortar as patilhas. “It looks good bro, It grows back in three days trust me its good, fresh”.
O Mohammed saiu do Paquistão com a família há 10 anos e ficaram no Dubai outros tantos. Como o seio familiar é too muslim, sentia-se como que in a cage e mudou-se para Malta. Depois passou temporadas em Itália, e está em Lisboa há 8 meses.
- I like the weather, I like the people.
Já me tinha cortado o lado direto do cabelo, quando aponto para os outros barbeiros da loja e pergunto - And did you already know those guys? Are you friends?
- Yeah, friends good - mas depois repensa - Well no, we are colleagues. My cousin is the owner.
- Oh nice, and what did you do before?
Ele olha para mim, como que admirado com a pergunta, num olhar de what do you mean what I did before, e responde - Always a baber bro. Also a bartender.
A meio somos interrompidos por um cliente que já tinha sido atendido por outro colega e que, num tom assim para o rude, lhe pede que limpe uns pelitos que sobraram no pescoço.
O Mohammed pede-me desculpa e vejo-o, pelo espelho, sair da loja e embicar os pés para chegar ao pescoço do cliente, que se vai embora sem agradecer.
Ele regressa e diz-me, em tom matreiro, “I don't have to clean that up, bro. Go home and take a shower, I am not your shower”.
Não percebi quantas línguas é que fala, mas são no mínimo cinco. A namorada é italiana, por isso o espanhol e português são-lhe fáceis. E diz que também muda o sotaque consoante a pessoa com quem está a falar.
- Do you think portuguese sounds like russian?, pergunto, porque muitos dizem que sim.
- Pff - quase me cospe - nah bro, russian is really different.
Estávamos quase a acabar quando entra uma rapariga portuguesa, simpática, roliça e branquinha, e nos alerta de uma manifestação anti-imigrantes, que se ia formar dali a minutos.
Alertou-os que tivessem cuidado, mas o Mohammed disse que já sabia e que não havia problema.
Perguntei-lhe se alguma vez sentiu descriminação e ele lança-me o ar de quem não precisa de reposta.
- Bro, I don’t get it. I pay my taxes, I do all good, everything legal, but people don’t like us.
- And what about in the other countries you lived in? - pergunto.
- Nah, just Portugal bro. I don't know why, bro.
Horas depois a Almirante Reis estava cortada. A polícia equipava-se em barreiras de quilómetros e os manifestantes erguiam bandeiras brancas e pujavam insultos de expulsão aos estrangeiros. Um fotógrafo registava o momento e eu quis esquecer-me da distopia na carruagem da Alameda.
:-)
ResponderEliminarboa, bro!
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