Saber existir

Hoje amanheci e fez-me sentido atestar um assunto em que cismo há várias luas. E embora não passe de uma picuísse etimológica, tem-me adormecido a sensação que “existir” demanda um estado mais atento do que “viver”. Que para viver basta respirar e que existir requisita, em peso, um estado presente.
    É possível que o desígnio de quem apenas vive mergulhe numa banalidade rotineira que o aprisiona ao que acha que é e impede o progresso. Por contrário, existir reclama uma análise constante. Uma introspetiva de quem, intermitentemente, se distancia para examinar a esfera em que tudo ocorre. É apenas com esse afastamento, de que só é capaz quem está presente, que se dá um novo calibrar. Para existir há que premeditar e pelo instinto se vive.
    Porque ainda que viver implique um costume, um plano e um espaço onde o aplicar, tudo pode ser consumado numa elevação latente. O “espaço” pode ser virtual, uma irrealidade trivial. Mas ninguém existe num meta-verso. Isto porque para existir, há que tomar a iniciativa ou acarretar a obrigação de ter que se deitar no simulador. A arte de existir requer perícia. Ou talento. A existência é tocável, sem filtros. Existir é consciência. Um ciclo de contínuo renascimento.
    Eu sou o peso de querer ser tudo e todos ao mesmo tempo que eu mesmo, e a consciência de que não sou nada que agora não sou ou poderei vir a ser. Assim serei sempre e alimento os meus Eu’s para que não perca a capacidade de os invocar. A existência terrestre relembra-me que a planta da minha carne ainda toca o solo, mas que posso sorrir quando me lembro do futuro.
    Assim que existo, parto, chego e reencontro-me. Porque, enquanto existir e for, controlo. E se alguma vez me perder sei, enquanto existir, que sou aquele que escolheu perder-se. 

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