Parágrafos

    O snobismo do escritor nasce de uma obsessão em resguardar as suas próprias palavras. Atribuir uma citação a um sujeito exclusivo e quere-la só para si é como quem não se desprende de um filho que está para sair de casa, na tentativa de não o partilhar com o mundo. Mas o filho não é totalmente de um pai, pois não? Algures entre as semelhanças surgem as diferenças que constroem o carácter. E um filho não causa estranhez porque não é novo. Nada é. Tudo que existe é a cópia de uma cópia de uma cópia. Já resistiu antes de mim. Copiando de um, será plágio. Copiando de vários, será originalidade a roçar o génio - E esta ideia, confesso, não é minha.
    Temos em nós, pequenos humanos, um relutante, mas delicado grau de egoísmo. Mimamos o gato porque lhe queremos bem ou porque o seu pelo nos é agradável ao toque? Ajudamos pelo outro ou pela gratificação que isso no dá? Arriscamos para ganhar, ou porque, tabu, desejamos falhar e fazer parte da linhagem que tem fundamentos de queixume? No nada queremos tudo e, no tudo, nada.
    Estes parágrafos, e outros, encontro-os perdidos em notas soltas e esquecidas. São um histórico de mim. Para lhes dar vida, mas não profunda conclusão - porque essa não me interessa mais que o seu desenvolvimento -, compilo-as em textos desconexos e sem razão:
    Ouvi-te e li-te num silêncio sem voz. Tenho tudo muito presente e tenho-te aqui. Que farei de mim, que não te tenho, agora que te conheço? Gosto de poder dizer que gosto do toque dos teus lábios embora esteja, para sempre, intocável de ti. Por algo que se esperava, algo aconteceu. Faz-se uma pausa e sei que me encanta a forma como pensas depois de um beijo. Dizes-me que o cliché não nos toca, mas duvido. 
    Ultimamente, e acreditava que o tinha por regra, escrevo depois de atingir o apogeu do aborrecimento ou o princípio da depressão. Mas, curiosamente, não o faço agora. Agora faço-o unicamente com o propósito de registar os meus antecedentes e, assim, livrar-me deles. E, como ter um propósito é o propósito mais importante de todos, faço-o. Fico um pouco mais leve, ainda que repetido.
    Numa ignorância, a que me permito, sei que prefiro a permanente admiração e deslumbramento a um descrédito da vida. Odeio nele o que temo em mim mesmo, e ele é derrotista. Então eu não sou. O ar é sempre branco e azul e escrevo-o sem poesias. Sou um narciso masoquista que se magoa para se ver sofrer. Adivinho-me ir a sítios: literais e literários.


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