Deitado na loiça fria da banheira, com um caderno quadriculado pousado num banquinho ao lado, sinto-me ocupado mas sem nada para fazer. Hoje tenho a cabeça um pouco pesada e os olhos particularmente cansados, por nenhum motivo atípico. Entre dois momentos relevantes na vida, existe uma pausa, por vezes insípida, que parece infinita. Uma eternidade que demora a passar. Uma espécie de meditação parada, em que a mente trabalha incessantemente à volta de um conjunto de pensamentos de nada e o corpo implora por alguma vida. Suponho que podia preencher este vácuo com algum tipo de atividade, mas gosto desta fuga - e pergunto-me se as pessoas à minha volta dão por ela. Pergunto-me também se este recesso é relevante para mim ou se estou a desperdiçar vida com esta minha pseudo-relutância em confraternizar. E, em perguntas para o nada, deixo-me afundar nesta peça sem água enquanto olho para o teto, a ouvir, sem vontade de me mexer.
Uma ode em três partes
CAPÍTULO I Conheci o Zé Carvalheiro numa ação de distribuição de bebidas gaseificadas. Fomos contratados para carregar mochilas térmicas de 15kg pelo verão infernal de Lisboa e só nos safou as que fomos bebendo à pala durante oito horas. Mais tarde reencontramo-nos numa ação de distribuição de mentos, mas nem as caixinhas que sobraram compensaram o preço que recebíamos à hora. Mas já não sei porque raio terá sido, ficamos amigos. O Zé estudou Belas Artes e agora é ilustrador no Público, mas na altura andávamos a fazer estes trabalhinhos de caca. Por vezes montava barracas na Feira da Ladra para exibir os seus trabalhos e cheguei a comprar-lhe um autocolante com uma ovelha que dizia "Life is a - meeeeh – zing", que guardei religiosamente na carteira. Uns meses depois descobrimos que éramos vizinhos. E em alturas em que eu não estava para aturar os 4 marmanjos com quem vivia, íamos à Paiva Couceiro ver os velhotes discutir e os putos ...
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